Literatura

Sobre o apaixonar

Adriel Dutra
Escrito por Adriel Dutra

Nunca disseram para nós que algumas vezes poderíamos encontrar alguém que nunca antes vimos e então aconteceria algo que nos deixaria confusos e não muito raro à beira da loucura. E então aconteceríamos como atravessados por sensações estranhas que não conseguimos nomear e que alterariam a respiração, fariam o sangue correr desgovernadamente, suicidariam as palavras, deixariam o coração em transe, fariam os pensamentos dançarem às trilhas do delírio, quebrariam as fortalezas da razão, derreteriam as geleiras do coração, enlouqueceriam a lucidez, nos fariam ver estrelas cantando óperas na frieza indiferente do universo, soprariam gélidas brisas na alma e incandesceriam a carne em brasas. Faria da existência uma vertigem do tudo ou do nada em alegrias ou tristezas, cujo terrível efeito nem os deuses se viram livres e então resolveram deixar aos humanos como interminável tragicomédia. E um dia chamamos isso simplesmente de paixão, uma palavra que diz muita coisa de muita coisa que compreendemos pouca coisa: mas pode acontecer.

É o amor, e não a vida, o contrário da morte. – Roberto Freire


Os gregos pré-socráticos foram, talvez, os últimos ocidentais a colocar a paixão como uma das maiores forças da vida. Mas depois de Sócrates o mundo racional entra em cena, fazendo da paixão uma afetação carente de racionalidade, portanto, relegada aos mais diversos sentidos desqualificadores.


Imagem: Jovem defendendo-se de Eros – pintura de Bouguereau (1825–1905)

Sobre o autor

Adriel Dutra

Adriel Dutra

Antes de tudo é formado pelos amores e desamores que vive, pelos livros, músicas e arte marginais, mas também psicólogo, filósofo, escritor de trechos errantes. Tem como hobbie ficar observando detalhes que ninguém costuma ver e fotografar coisas que ninguém quer ver.