Filosofia

Não espere por uma revolução, promova microrrevoluções

Adriel Dutra
Escrito por Adriel Dutra

Talvez nos pese o que chamamos de revolução – algo como uma mudança radical no mundo. Não me convence pensar em uma revolução que irá transformar o mundo, prefiro pensar em microrrevoluções, e estas todos nós temos possibilidades de realizar. Não se faz revolução se antes nós mesmos não nos revolucionarmos, revolucionar o nosso corpo, nossos regimes de sensibilidades, nossos modos de ser e pensar. Não esperar por uma revolução, mas promover microrrevoluções – estas podem se realizar todos os dias… e  incomodar os micropoderes. As lutas são sutis.

Acho extraordinário Guattari ter chamado atenção para revoluções sutis, que podem operar em nossos modos de viver e nas cidades e locais em que nos situamos a todo instante e, no entanto, nem sempre nos damos conta. Aquela revolução de que os marxistas nos falam não levou em consideração que o poder nos constrange sutilmente – e diariamente – as nossas possibilidades de existir. Tornar um corpo impotente, esvaziar-nos, deixar-nos constrangidos para agir e pensar, indiferenciar nossas sensibilidades e nos padronizar para um modo de vida dominante… são algumas das mortes que os poderes promovem em nós caso fiquemos à espera de uma grande revolução.

Le Cinématon de Gérard Courant. N°822 Félix Guattari

Le Cinématon de Gérard Courant. N°822 Félix Guattari

Construir sua própria vida, construir algo de vivo, não somente com os próximos, com as crianças — seja numa escola ou não — com amigos, com militantes, mas também consigo mesmo, para modificar, por exemplo, sua própria relação com o corpo, com a percepção das coisas: isso não seria, como diriam alguns, desviar-se das causas revolucionárias mais fundamentais e mais urgentes? Toda questão está em saber de que revolução se trata! Trata-se, sim ou não, de acabar com todas as relações de alienação — não somente as que pesam sobre os trabalhadores, mas também as que pesam sobre as mulheres, as crianças, as minorias sexuais, etc., as que pesam sobre sensibilidades atípicas, as que pesam sobre o amor aos sons, às cores, às idéias… Uma revolução, em qualquer domínio que seja, passa por uma libertação prévia de uma energia de desejo. E, manifestamente, só uma reação em cadeia, atravessando as estratificações existentes, poderá catalisar um processo irreversível de questionamento das formações de poder às quais está acorrentada a sociedade atual.

GUATTARI, Félix, Revolução Molecular

Sobre o autor

Adriel Dutra

Adriel Dutra

Antes de tudo é formado pelos amores e desamores que vive, pelos livros, músicas e arte marginais, mas também psicólogo, filósofo, escritor de trechos errantes. Tem como hobbie ficar observando detalhes que ninguém costuma ver e fotografar coisas que ninguém quer ver.